Torcedor fanático do Corinthians, o cirurgião vascular Jorge Kalil é diretor-adjunto de futebol do clube Em 41 anos de carreira em centro cirúrgico, ele diz que nunca usou nenhuma peça de roupa verde — lembrando que o verde é a cor dos uniformes médicos e da camisa do maior rival, o Palmeiras. "Sou alérgico", brinca ele, que fala em seus 66 anos de vida nunca usou a cor.



A insistência do em rejeitar a cor no seu local de trabalho já rendeu discussões. Kalil explica que, nos hospitais, é comum que cirurgiões usem uniforme verde, enquanto a equipe de enfermagem veste azul e os prestadores de serviço, cinza. No geral, ele opta pela roupa dos enfermeiros em suas cirurgias e acaba confundido com esses profissionais.

"Os médicos me pediam: 'por favor, enfermeiro, você sabe onde está o meu paciente?' E até explicar que eu era médico e que não estava com aquela cor de roupa (verde), era complicado. Eu dizia que é porque eu tenho alergia quando eu ponho verde", conta aos risos.

Em outra situação, uma funcionária de um hospital pediu que ele se retirasse da sala de descanso exclusiva de médicos por não estar usando o uniforme verde."Ela me disse: 'desculpa, mas o senhor não é médico. Médico aqui tem que estar de verde'. Eu olhei para ela e falei: 'Se eu usar verde eu tenho que tomar um antialérgico, um corticoide, porque vai fazer mal'". Segundo Kalil, a mulher perguntou nome e o CRM (identificação do profissional) dele e foi checar a veracidade da história.

Em outra ocasião, Kalil diz que quase brigou com um anestesista."Tive uma discussão com o anestesista, um palmeirense fanático, chato, muito chato. Ele veio discutir que o Corinthians ganhou roubado. Uma vez quase fomos para vias de fato. Eu estava com um copo d'água na mão e falei: 'Se você continuar, vou jogar essa água nessa tua roupa verde'", contou o médico. Em tempos de covid-19, o médico encontrou mais uma forma de mostrar o amor pelo clube: usa uma máscara com o escudo corintiano e a cirúrgica por cima.

E não é só no trabalho que já enfrentou situações curiosas por não usar verde. Kalil já devolveu uma camiseta de uma marca famosa que ganhou de presente de um paciente. A peça tinha a gola e o símbolo, um jacaré com gola verde. "Eu não quero nada verde, nem o jacaré. Eu dei de presente para minha filha e falei: 'vai lá e troca por alguma coisa pra você porque nem o jacaré eu uso de verde'".

Mulher palmeirense e filhos corintianos

Quis o destino que ele se casasse com uma palmeirense, mas garante que nem por isso as cores do rival ganham espaço em casa. "Ela é palmeirense, mas acima de tudo torce para mim. Somos casados há 25 anos, mas ela não liga para futebol. Se você perguntar quem é o goleiro do Palmeiras, é capaz dela falar que é o Leão. Não sabe nada de futebol e usa o verde normal".

Kalil diz que, uma vez, quando a Parmalat ainda patrocinava o rival, a mulher comprou uma caixa de leite da marca. "Foi tudo para o tanque, joguei tudo fora". "Está dentro de mim. Eu não uso verde para nada, nem abacate, eu como", exemplifica.

Assim como o pai, os três filhos (Tomas, de 30 anos; Caio, de 25; e Vitória, de 23 anos) são corintianos fanáticos. O mais velho, inclusive, seguiu os passos do médico e é conselheiro do clube de coração. Para Kalil, o amor pelo Corinthians veio antes do seu próprio nascimento. O pai dele, que também era médico, foi conselheiro do clube em 1972. Kalil se tornou sócio em 1970, e poucos anos depois também concorreu ao conselho do clube. "Fui seguindo os passos do meu pai em tudo na minha vida. Meu pai era cirurgião vascular, era conselheiro do Corinthians. Meu maior ídolo".

O nome do pai, Wady Jorge Kalil, foi usado para batizar o nome de uma Unidade Básica de Saúde no Tatuapé, na zona leste de São Paulo, onde fica o Parque São Jorge, antiga casa do Corinthians. Em 2000, quando o pai morreu, ele herdou o cargo de conselheiro vitalício do Timão. Dentro do clube, já foi diretor do departamento médico, membro do Cori (Conselho de Orientação), presidente do Cori, vice-presidente de diretoria e, agora, é diretor-adjunto de futebol.



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