1/4/2016 07:57

Samba no Corinthians, promessa para sair da fila em Aparecida e Copa: o último mês de futebol de Garrincha

Samba no Corinthians, promessa para sair da fila em Aparecida e Copa: o último mês de futebol de Garrincha
Garrincha defende o Corinthians contra o ex-clube Botafogo, no Maracanã, em 1966

"Sempre tive o desejo de vestir essa camisa. Eu fico bem dentro dela, não?"

Foi assim que Garrincha respondeu ao então presidente do Corinthians, Wadih Heluh, ao vestir pela primeira vez a camisa do clube alvinegro, em 13 de janeiro de 1966, no Parque São Jorge, na zona leste de São Paulo, vindo de um voo noturno do Rio.

Após 13 anos de Botafogo, até então seu único clube, Garrincha chegou a São Paulo animado. Aos 32 anos, tinha a expectativa de recuperar sua condição física e ser novamente capaz de fazer jogos em sequência, encantar o público com suas jogadas e seus dribles e dar ao Corinthians um título, algo que a torcida não via desde 1955.

Contratado em janeiro, Garrincha pôde estrear somente em março por causa do físico debilitado com sucessivas lesões mal tratadas em ambos os joelhos. Ainda assim disputou sete jogos em 25 dias - mais do que havia conseguido fazer pelo Botafogo nos dois anos anteriores. Fez dois gols nesse período e, no final daquele mês, ajudou o Corinthians a conquistar o Torneio Rio-São Paulo, feito pouco comemorado porque a taça foi dividida com Botafogo, Santos e Vasco, todos empatados em número de pontos.

Garrincha chuta contra o goleiro Fábio, do São Paulo, no Pacaembu, em 1966


Há um consenso entre os que conviveram com Garrincha de que o ponta-direita apresentou durante o mês de março de 1966 o que restava de futebol nele. Tanto que no dia 1º de abril, ou seja, há 50 anos, ele se apresentou ao técnico Vicente Feola para a seleção brasileira que disputaria a Copa do Mundo da Inglaterra poucos meses depois.

A experiência na Inglaterra e o que seu viu depois já não faziam jus ao que Garrincha foi no futebol. A passagem pelo Corinthians terminaria apagada em novembro de 1966. Depois, ele ainda jogou algumas partidas por Junior de Barranquilha, da Colômbia, Flamengo e Olaria, até encerrar a carreira de forma definitiva em março de 1972.

No aniversário de 50 anos da passagem de Garrincha pelo Corinthians, a ESPN preparou um especial sobre o ponta-direita bicampeão mundial pela seleção brasileira (1962 e 1966), com fotos, entrevistas e histórias recuperadas dos jornais da época. Confira:

A CONTRATAÇÃO

Garrincha estava desgastado com a diretoria do Botafogo desde a conquista da Copa do Mundo com a seleção, em 1962, quando brigou para ter o contrato melhorado e não foi atendido. A frustração aumentou no ano seguinte quando o clube carioca recusou vender o jogador para o futebol italiano.

Garrincha em ação pelo Botafogo


O desgaste ficou ainda maior por conta das condições físicas de Garrincha, que recusava-se a operar o menisco de ambos os joelhos. Quando finalmente aceitou foi com o médico do América-RJ, o que só aumentou a tensão entre os dois lados. Com poucos jogos em 1964 e 1965, era nítido o desejo dele de sair e do Botafogo em vendê-lo.

Corinthians e Botafogo começaram a negociar em 29 de dezembro de 1965. Segundo o livro "Estrela Solitária", escrito por Ruy Castro, o pontapé inicial foi dado por um pai de santo chamado Alberto. Ele recomendou a Garrincha e a Elza Soares que deixassem o Rio de Janeiro porque havia muita energia negativa na cidade contra eles. Como tinha contato com Oswaldo Brandão, então técnico corintiano, o pai de santo colocou os dois em comunicação para que a negociação iniciasse.

José Teixeira, ex-técnico e ex-preparador físico do Corinthians


"Eu fui enviado ao Rio de Janeiro a pedido do Brandão para passar um dia inteiro com o Garrincha e observar o comportamento dele. O Garrincha me recebeu muito bem. Ele estava fora de forma, mas eu queria observar os joelhos dele. Em nenhum momento ele colocou as mãos nos joelhos, gesto comum para quem tem problemas. Ao voltar para São Paulo dei aval para o Brandão: pode contratar que vamos recuperá-lo", disse à ESPN José Teixeira, 80, que naquela época era preparador físico do Corinthians.

Uma comitiva de cartolas corintianos foi ao Rio para tratar com o Botafogo. Mas foram diversos encontros porque o clube carioca recusou fazer negócio. Somente no dia 13 de janeiro (após 17 dias de tratativas) é que a venda foi selada. A reunião que definiu a contratação demorou cinco horas, segundo "O Estado de S. Paulo".

O Corinthians adquiriu o passe do ponta-direita por Cr$ 220 milhões (hoje, cerca de R$ 400 mil, segundo correção monetária pelo índice IGP-DI FGV). A assinatura do contrato ocorreu no dia 15. Ele assinou até o final de janeiro de 1968, com salários mensais de Cr$ 200 mil (R$ 350 mil) e recebeu luvas de Cr$ 12 milhões.

A FOTO DA DISCÓRDIA

Antes de a negociação ter sido concretizada, um ato de Garrincha quase fez tudo ser cancelado. Em dia 6 de janeiro, ele veio a São Paulo - chegou às 11h, em Congonhas, acompanhado de Elza Soares - para fazer exames médicos com o doutor João de Vicenzo, a pedido do Corinthians. Chegou a posar para fotos com a camisa do Corinthians, dadas pelos jornalistas Vital Battaglia e José Maria de Aquino, do "Jornal da Tarde". Isso irritou o Botafogo, que não havia autorizado à vinda dele.

Para tentar corrigir a confusão, o Corinthians negou o pedido de exame e disse que o jogador veio para a cidade para acompanhar Elza durante a gravação de um 'vídeo-tape' numa emissora de televisão. Garrincha e Elza confirmaram a versão.

FESTA PARA RECEBER GARRINCHA

Garrincha desembarcou no aeroporto de Congonhas numa quinta-feira, dia 13 de janeiro. Uma multidão o aguardava, segundo os jornais da época. Ele veio do Rio em um bimotor Sadia, com prefixo PP-SDI, mas em São Paulo ninguém sabia o horário que chegaria. Por isso toda a aterrisagem de aeronoves do Rio eram acompanhadas com maior atenção pelos presentes. O ponta-direita chegou somente às 20h.

"Já cheguei a São Paulo driblando alguém", brincou Garrincha, durante o desembarque, ao saber da confusão em torno do seu horário de chegada.

Novamente ele vestiu uma camisa do Corinthians e posou para fotos. Segundo o livro "Estrela Solitária", dessa vez Battaglia e José Maria de Aquino pediram uma camisa emprestada para Rivellino, vizinho do aeroporto, que cedeu uma com o número 10 e não o 7 com o qual Garrincha brilhou no Botafogo e na seleção brasileira.

Garrincha com a camisa do Corinthians na sala de troféu do clube


Depois, Garrincha foi levado de carro para o Parque São Jorge. Ao lado de Elza Soares, é claro. Ao chegar lá nova multidão o aguardava, inclusive Elisa, a torcedora símbolo do clube, e com quem o ponta-direita recebeu beijos, abraços e tirou fotos.

Garrincha ainda foi encaminhado à sala de troféus, vestiu a camisa branca (alguns dirigentes diziam que a listrada 'dava azar') e concedeu entrevistas. Até o fizeram fumar charuto. Foram quase duas horas a disposição da imprensa e dos dirigentes. Depois foi encaminhado ao Hotel Danubio (na rua Brigadeiro Luís Antônio), onde ficou até se mudar para a rua Maranhão, no bairro do Higienópolis.

TREINOS FÍSICOS E SAPATO DE CHUMBO

No dia 16 de janeiro, Garrincha passou por exames médicos. Ele chegou ao Corinthians com 78 quilos, seis a mais do que o normal segundo as fontes da época. O técnico Oswaldo Brandão determinou que o ponta-direita deveria ficar fazendo treinamentos físicos com breves 'bate-bolas' antes de iniciar os treinos coletivos de 30 a 45 dias.

Treinou pela primeira vez em 22 de janeiro, quando compareceu ao Parque São Jorge às 9h. Teve tempo de conhecer os companheiros, que estavam indo em direção ao aeroporto para uma viagem para Londrina. O primeiro treino foi acompanhado pelo preparador físico José Teixeira. O roteiro: ginástica no solo e exercícios abdominais.

Garrincha chega ao Parque São Jorge para treinar


"Havia muita curiosidade de todos. A imprensa queria ver o Garrincha em campo. O que eu fiz foi combinar com ele um horário de exercícios e depois eu o levava para completar a atividade no campo. Aí os jornalistas podiam vê-lo, tirar fotos etc. Eu elaborei um programa bem rígido de treinos. A ideia era recuperar o peso dele e dar força aos quadris. Ele tinha uma perna mais curta do que a outra e precisava ter força nos quadris para conseguir executar as jogadas dele", explicou José Teixeira.

Um dos treinos consistia em um trabalho puxado de exercícios com um tal de sapato de chumbo. O termo é incomum atualmente, mas na época era bem utilizado.

"Era um sapato de ferro, com peso, para ele fortalecer a perna direita. Era a perna mais desgastada e que fez ele ficar muito tempo sem jogar no Botafogo. E eu tenho de admitir que ele foi muito correto com a nossa programação. Não faltou nenhuma vez nem se atrasou. Também não reclamava. Era um sujeito muito simples", completou.

Em 26 de janeiro, Garrincha recebeu a visita de Nilton Santos, que até vestiu a camisa corintiana e jogou bola na Parque São Jorge com alguns garotos. Quem também costumava jogar contra o ponta-direita era Teixeira.

"Ele pegava a bola e falava 'Professor, fica aí que vou te driblar'. Eu me preparava para tomar a bola dele e o danado passava com uma facilidade. Mesmo fora de forma, com as pernas ainda fracas, ele fazia aquilo brilhantemente. Eu já fui 'João' diante do Mané, mas tenho orgulho. Fazia parte do trabalho de recuperação".

Garrincha ficou quase até o final da primeira quinzena de fevereiro sem atividades com bola. Somente a partir do dia 13 que o ritmo mudou. Treinava também corrida, ginástica e chutes de longa distância. Algumas vezes treinava com blusão de nailon e camisa plástica para perder peso. "Eram os conceitos da época", disse Teixeira.

BEBIDA, PROMESSA E VIDA NOVA

Apesar de não ser algo de conhecimento das pessoas próximas de Garrincha, o ponta-direita já tinha problema com álcool quando chegou ao Corinthians.

Garrincha após participar de um treino pelo Corinthians, no Parque São Jorge


Segundo o livro "Estrela Solitária", Garrincha bebia escondido de Elza Soares, que era contra o hábito do companheiro. O jogador escondia garrafas pelo apartamento e tinha os estabelecimentos certos para comprar quando a mulher jogava o estoque fora.

José Teixeira, que acompanhava Garrincha no Corinthians e chegou a jantar algumas vezes com o casal, disse que jamais viu o jogador beber. "Falam que ele bebia muito. Na minha frente e no clube ele nunca bebeu. Nunca chegou ao Corinthians em condições complicadas ou que indicassem bebedeira", disse o veterano.

Mas Garrincha tinha consciência do problema. Segundo Ruy Castro descreve na biografia do jogador, o ponta-direita autorizou o Corinthians a descontar diretamente do pagamento o valor que deveria pagar de pensão para a ex-mulher e de aluguel do apartamento, assim não correria o risco de acumular dívidas.

De fato, a vinda para o Corinthians representou um recomeço para Garrincha. Ele mal estava jogando pelo Botafogo e só recebia por partida disputada. Teve de se mudar de casa mais de uma vez no Rio e acabava contando com os ganhos de Elza para se manter no dia a dia. Não ia ao clube treinar e alternava uma rotina que incluía ficar deitado, pescar, passear com os passarinhos e beber em casa ou nos bares.

No clube paulista tudo era diferente. Ele ia sempre aos treinos, recebia um salário mensal e, o bom comportamento, fez até o clube liberar Garrincha para curtir o Carnaval no Rio de Janeiro, em 17 de fevereiro - recebeu uma folga de três dias.

Garrincha chegou a ir até a cidade de Aparecida do Norte com Elza Soares para visitar a Basílica de Nossa Senhora Aparecida, em 21 de janeiro. Além de agradecer pela vinda ao Corinthians, ambos fizeram uma promessa de regressar se o time fosse campeão e quebrasse o jejum - a última taça havia sido a do Campeonato Paulista de 1954, cujo jogo do título fora em 6 de fevereiro de 1955. A pressão era muito grande.

"Fomos comprar uma vela do meu tamanho. A promessa de Elza era um pedido à santa para que eu fosse contratado pelo Corinthians. O negócio era mesmo pagar. O pior é que ela não ficou satisfeita. O vendedor das velas era corintiano e não quis receber o dinheiro. Eu disse para ela deixar isso para lá. Também fiz uma promessa, e a gente pode depois pagar tudo", disse Garrincha para "A Gazeta Esportiva".

SAMBA

Uma estrela: Garrincha foi capa de 'A Gazeta Esportiva Ilustrada'


A vinda de Garrincha para o Corinthians rendeu até um samba de Ary Lobo, o mesmo autor do sucesso "O último pau-de-arara".

O samba foi intitulado "O balanço do Garrincha", e a letra é:

Vocês devem saber
Porque o Garrincha
Foi bicampeão
Quando ele chuta a bola
Ate parece um tiro de canhão
Ele balança pra lá, balança pra cá
Com essas pernas de arrasar
A torcida presta atenção
Ele fazendo cara de João

Hoje ele esta no Corinthians
Que o clube das multidão
E a torcida chorando e gritando
Desmaiando de emoção
O glorioso Corinthians
Cheio de gloria e de tradição
A torcida tem no coração
Que o Corinthians vai ser campeão

NASCE O TIMÃO E A ESTREIA

A contratação de Garrincha foi a mais chamativa em 1966, mas o Corinthians já vinha se reforçando com ótimos jogadores. Trouxe o zagueiro Ditão e o volante Nair, da Portuguesa, e o atacante Tales, da Ferroviária. Wadih Helu queria quebrar o jejum.

Principal jornal esportivo no país, "A Gazeta Esportiva" aproveitou o momento e criou o apelido que ficou enternizado entre os corintianos: Timão.



Garrincha em lance contra o São Paulo, no Pacaembu


"Além desses nomes, tinha Dino Sani, Edson Cegonha, Rivellino, Flávio Minuano e Gilson Porto. Eu não me recordo de nos chamarem assim, mas concordo: era mesmo um timão", brincou José Teixeira, ao ser questionado sobre o tema.

No dia da estreia de Garrincha, "A Gazeta Esportiva" estampou como manchete: "Voces vão ver como é: Ditão, Nair e Mané", uma referência à música composta para a seleção, em 1962 - 'Vocês vão ver como é: Didi, Garrincha e Pelé...'

Mas Garrincha estreou antes de estar totalmente em forma e o motivo para que isso ocorresse foi a pressão da torcida e a de dentro do próprio clube - a oposição era liderada por Vicente Matheus, que acusava Wadih Helu de ter excedido nos gastos.

Garrincha não vinha treinando com os companheiros, algo que fez na véspera da estreia. Participou de um coletivo com Cabeção (Barbosinha); Mendes, Eduardo, Cláudio e Batista; Didi e Luizinho; Garrincha, Adnan, João Carlos e Lúcio.

O ponta-direita estava nervoso para enfrentar o Vasco da Gama, em 2 de março, no Pacaembu. Muitos amigos do Rio vieram para São Paulo para assisti-lo. "Ele sabia que ainda não estava pronto, que precisava de mais tempo. Ele queria jogar, mas tinha consciência da nossa programação. No vestiário, eu fui até ele e disse: 'Você não vai afinar para os caras, vai? Faz aquilo que você faz comigo no treino. Quero ver você repetir isso no campo diante deles", revelou José Teixeira.

A estreia, no entanto, não foi marcante para o Corinthians: derrota por 3 a 0. Foi o primeiro revés no Torneio Rio-São Paulo. Garrincha pegou poucas vezes na bola. Em um lance, chegou a ser desarmado com facilidade pelo lateral Odair, do Vasco. A torcida estranhou, mas ainda assim a participação dele não foi criticada.

O jornal "O Estado de S. Paulo" avaliou bem o ponta-direita e relatou que o jogador conseguiu realizar várias vezes as suas jogadas características de fintas e lançamentos. "Aos 10 minutos, ele fez a jogada mais famosa, passando a bola entre as pernas de Fontana e depois cruzando para a área, mas Brito afastou", descreveu o jornal.

O MÊS MÁGICO

A segunda partida foi contra o Botafogo, no Maracanã. Houve muito respeito nesse reencontro, mas o placar foi vergonhoso para o Corinthians: perdeu por 5 a 1.

Os relatos daquela época registraram que Garrincha jogou bem apenas no primeiro tempo, quando o placar era favorável ao Botafogo por 2 a 1.

Garrincha marca o gol contra o São Paulo


Apesar do início difícil, as coisas melhoraram rapidamente. O Corinthians viajou para Belo Horizonte para disputar um amistoso com o Cruzeiro. A sensação, é claro, seria a presença de Garrincha, o que fez o clube paulista receber uma quota de Cr$ 20 milhões.

A atuação de Garrincha foi excelente, segundo os jornais. O primeiro gol corintiano teve participação dele. Após realizar a jogada característica na ponta-direita, ele cruzou para Tales marcar, aos 10 minutos da fase final. Tostão empatou em cobrança de pênalti, aos 27, mas Garrincha fez o gol da vitória por 2 a 1, aos 38.

Sem muitos detalhes sobre o amistoso em Minas, "O Estado de S. Paulo" descreveu o gol assim: "Aos 38 minutos, Garrincha novamente dominou vários adversários e completou para a meta, estabelecendo a contagem final".

Em seguida, nova vitória corintiana e recuperação no Torneio Rio-São Paulo: 2 a 0 no São Paulo, no Pacaembu. Para muitos, foi o melhor jogo de Garrincha e o que fez com que Vicente Feola passasse a observá-lo para a seleção brasileira.

O ponta-direita fez o primeiro gol do duelo. O lance começou com ele recebendo a bola de Tales na ponta-direita. Depois ele correu até a linha de fundo, escapou da marcação de Renato e chutou cruzado, rasteiro e sem ângulo. Ainda assim a bola passou entre o goleiro Fábio e outros são-paulinos, bateu na trave direita e entrou no gol.

O segundo gol teve participação dele também. Da direita, ele cruzou para área. Gilson Porto recebeu e tocou para Tales, de primeira, marcar para o Corinthians.

Na sequência o time enfrentou o Palmeiras (teve só um dia de descanso) e perdeu por 2 a 1. Garrincha teve a chance de marcar o terceiro gol dele pelo Corinthians, mas perdeu um pênalti defendido pelo goleiro Valdir Joaquim de Moraes.

A derrota no clássico obrigou o Corinthians a vencer o Flamengo para continuar na briga pelo título do Torneio Rio-São Paulo. Novamente com Garrincha inspirado o time paulista triunfou: 3 a 1. Ele não marcou nem deu assistências, mas deixou os torcedores animados por exibir os seus dribles e as suas fintas características.

Observado por Baltazar, Garrincha treina


O destino reservou para a última rodada o clássico com o Santos. O rival não era derrotado pelo Corinthians em jogos do Campeonato Paulista desde 21 de julho de 1957. Até o jogo de 1966 tinham sido disputadas 28 partidas, com apenas quatro triunfos corintianos (três pelo Torneio Rio-São Paulo e um pela extinta Taça São Paulo).

Mas, dessa vez, uma vitória daria ao time de Parque São Jorge o título do interestadual. O jogo foi tenso. O santista Coutinho foi excluído por ter dado uma cabeçada em Edson e Mengálvio também foi expulso por reclamar da decisão do juiz, aos 34 minutos do segundo tempo. O jogo estava empatado sem gols quando Zito cometeu pênalti em Garrincha, aos 42 minutos do segundo tempo.

"Eu estava em campo e comemorei. Finalmente a gente ia acabar com o jejum. Ia vencer o Santos, que era terrível contra o Corinthians, e comemorar o título. Eu lembro até hoje do Mané partindo para a área, tentando a jogada dele e sendo derrubado pelo Zito, mas não foi suficiente ter aquele pênalti", recordou Rivellino à ESPN, com tristeza.

Flávio cobrou a penalidade e perdeu. Foi uma tristeza geral, embora o empate tenha dado o título para o Corinthians, mas ele foi dividido com Botafogo, Santos e Vasco. Todos terminaram a competição com 11 pontos. Como não havia mais datas disponíveis para realizar jogos desempate, todos ficaram com o título.

COPA DO MUNDO

Garrincha se apresentou à seleção brasileira no dia 1º de abril de 1966, no Rio de Janeiro. A Copa do Mundo iniciaria apenas em 11 de julho, mas a ideia da CBD era treinar o time para buscar o tricampeonato.

O problema é que foram convocados 45 jogadores para 22 vagas.

Durante os três meses de preparação, Feola testou vários times e foi cortando os jogadores conforme o Mundial se aproximava. A CBD estava confiante. Acreditava que com Garrincha e Pelé jamais perderia a taça. Mas a preparação não foi tão boa quanto se imaginou. Ao chegar ao torneio, o técnico ainda não tinha um time.

Mesmo sem o mesmo futebol do passado, Garrincha foi titular e ficou entre os 22 convocados - sendo o único representante do Corinthians na Copa.

O Brasil foi eliminado na fase de grupos, jogando cada um dos três jogos com uma formação diferente. Ganhou na estreia da Bulgária (2 a 0). Perdeu para a Hungria (1 a 3) e para Portugal (1 a 3), terminando somente à frente dos búlgaros no Grupo 3.

Um encontro entre Pelé e Garrincha, em 1958 - quando jogaram juntos pela seleção pela 1ª vez


Garrincha disputou os dois primeiros jogos.Era evidente que ele já não tinha o mesmo pontecial de outros tempos. No primeiro jogo ainda conseguiu marcar um gol de falta. Pelé fez o outro e foi a última partida que eles jogaram juntos pelo Brasil - aliás, juntos, eles jamais perderam pela seleção: 40 jogos, 36 vitórias e quatro empates.

Diante da Hungria, Pelé não jogou e Garrincha tomou um baile dos húngaros. Não conseguiu vez alguma executar as suas jogadas e mostrou ao mundo que não era o mesmo. Foi a primeira e única derrota dele com a seleção. Em 60 jogos, o ponta-direita conseguiu 52 vitórias, sete empates e apenas essa derrota.

"O Garrincha não era o mesmo e nós percebemos isso no Corinthians. O melhor jogo dele foi contra o São Paulo, mesmo assim não fazia sombra ao jogador que todos conheciam. Ele deu certo naquele início no Corinthians porque fizemos um trabalho rigoroso de fortalecimento muscular. Na seleção, esse trabalho não teve sequência e ele regrediu. Ele voltou ao Corinthians péssimo", analisou Teixeira.

RETORNO AO CORINTHIANS EM BAIXA

Não era apenas o estado físico de Garrincha que estava aquém do ideal. O estado de espírito dele também estava destruído. Ele se juntou ao Corinthians em 1º de agosto, no Hotel Mantovani, em Águas de Lindoia, onde a equipe fazia uma inter-temporada antes do início do Campeonato Paulista. Foi examinado pelos médicos João de Vicenzo e Haroldo Campos e recebeu a notícia de que teria de iniciar todo o trabalho físico.

Para piorar, Brandão pediu demissão do Corinthians no dia 5. Irritado com a interferência da diretoria, o treinador gaúcho decidiu sair. Os cartolas foram buscar o argentino Filpo Nuñes, que não tinha a mesma paciência com Garrincha.

Garrincha participa de treino do Corinthians


Pela programação da comissão técnica, o ponta-direita deveria ficar 45 dias fazendo um trabalho específico para recuperar-se, mas novamente uma ordem da diretoria alterou a programação. Isso porque o Corinthians foi convidado para disputar o Troféu Ramón de Carranza, na Espanha, contra Real Madrid, Torino e Zaragoza, mas a condição imposta foi de que Garrincha estivesse presente com a delegação alvinegra.

Filpo Nuñes levou Garrincha contrariado. O ponta-direita jogou apenas o primeiro tempo do duelo com o Real Madrid - empate por 1 a 1 e derrota nos pênaltis por 3 a 2. Diante do Zaragoza jogou os 90 minutos na derrota por 2 a 0 na disputa da terceira colocação. Os jogos foram realizados em 3 e 4 de setembro, respectivamente.

Garrincha voltaria a atuar pelo Corinthians em apenas mais quatro partidas. Uma delas foi no clássico contra o Santos, em 8 de outubro. Foi o primeiro e único Pelé x Garrincha com as camisas de Santos e Corinthians e também a estreia do ponta-direita no Campeonato Paulista. Detalhe é que o duelo foi no final do primeiro turno do Estadual e o time do Parque São Jorge perdeu por 3 a 0 - três gols de Coutinho. A derrota tirou a liderança da equipe paulistana, caindo para o segundo lugar. O São Paulo virou o líder.

José Teixeira, ex-preparador físico do Corinthians


O Garrincha que se apresentou diante do Santos foi praticamente um ex-jogador. Não conseguiu fazer nenhuma de suas jogadas e recebeu poucas bolas dos companheiros. Alguns jornais relataram que foi como se o Corinthians jogasse o clássico com um homem a menos.

Foram mais três jogos com a camisa do Corinthians: goleada por 5 a 1 contra o Botafogo-SP, no Parque São Jorge, derrota por 3 a 1 para a Portuguesa, no Pacaembu, e vitória contra a Prudentina por 1 a 0, no Pacaembu.

A última partida foi em 23 de novembro de 1966. A exemplo do que ocorrera contra o Santos, Garrincha foi quase invisível em campo. O técnico nesse jogo já não era mais Filpo Nuñes, que não suportou a pressão com a queda corintiana. Era Zezé Moreira, com quem Garrincha tinha uma boa relação, mas nem isso o animou.

DESPEDIDA

Garrincha estava incomodado por não ser mais chamado para os jogos. A insatisfação dele fez com que ele deixasse de ter a mesma disciplina nos treinos. Não era mais o jogador que chegou ao clube empolgado para recuperar o futebol.

A impresa da época noticiou que havia um descontentamento dele com o técnico Filpo Nuñes. Algo que Garrincha nunca confirmou oficialmente. O mais perto que chegou foi uma declaração dada por ele ao programa "Vox Populi", da TV Cultura, em 1978.

"Tive a felicidade de ir para o Corinthians jogar, mas não tive a felicidade de ficar até o término do contrato porque infelizmente existiu uma pessoa que não deixou eu continuar. Enquanto eu estava com o Brandão tudo bem, mas essa pessoa entrou como treinador no Corinthians e não sei, acho que não gostava muito de mim", disse ele.

"Fui ao Wadih Helu e falei que ia embora. Ele falou 'Não, não sou eu só. Tem uma porção de diretores'. E eu falei 'Não tem problema. Eu falando só com o senhor está ótimo'. E ele falou 'Então, está bem'. Eu fui embora para o Rio e meu contrato foi suspenso. Depois me deram meu passe livre", resumiu Garrincha sobre a saída do time.

Formação do Corinthians contra a Portuguesa, com Garrincha (primeiro agachado à esq.)


Mas o final não foi tão amistoso assim. O Corinthians liberou o jogador, mas ficou com o passe dele. O acordo é que Garrincha não jogaria mais e poderia procurar outro clube. Os salários foram suspensos e, assim, ele voltou a morar no Rio de Janeiro.

Durante um tempo o Flamengo manifestou interesse em contratá-lo por empréstimo, mas o Corinthians não aceitou. O caso fez com que durante um ano (1967) Garrincha só fizesse jogos de exibição. A situação só alterou no meio de 1968, quando surgiu a proposta do Junior de Barranquila para alguns jogos e ele topou.

O saldo da passagem de Garrincha pelo Corinthians foi: 13 jogos, cinco vitórias, dois empates e seis derrotas, com dois gols marcados. Ganhou o Torneio Rio-São Paulo (com mais três clubes) e foi chamado para a Copa do Mundo da Inglaterra.

Ao "Vox Populi", o ponta-direita, que morreu em 20 de janeiro de 1983, resumiu assim o que representou o Corinthians para ele:

"Eu sou corintiano, gosto do Corinthians".


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